ela era daquele jeito mesmo

Ela era daquele jeito mesmo, e eu aceitava. Abaixava a cabeça e respondia: sim. E foi assim durante bons oito anos. Como exemplo; havia ocasiões em que eu chegava do trabalho, mal me assentava, ia à padaria buscar seus cigarros que já estavam no fim, era o que ela desejava e o que eu queria fazer. E eu a amava, era como um ofício; reconheço pequenas barreiras, mas eram barreiras a serem vencidas. Pra passear, o que ela gostava, e só do que gostava, era a visita a sua mãe; não que na volta eu deixasse de convidá-la para um sorvete, sempre convidava, mas ela, sempre muito cansada, me mandava parar na padaria e comprar um pote e aproveitar para comprar o pão e o leite.

Ainda há palavras lindas a serem ditas, há grandes momentos a serem vividos; nunca foram. Quando Iara não estava lendo algo, se interessava pela tevê. Não, não era ruim, eu a amava e amava mesmo, isso era o que importava; mesmo de três anos pra cá, quando saiu de sua forma ideal e já não tinha mais quase nenhuma beleza física; andava suando muito, por qualquer mínimo esforço, consequência da sua vida sedentária.

Sábado de manhã eu saía pra pelada com os amigos, rotina, e nunca me atrasei para o almoço que eu mesmo trazia. Chegava cheio de saudade. Geralmente Iara estava acordando, e consequentemente fumando.

- Vamos amor, lava este rosto, vamos dar uma caminhada e tomar um ou dois chopes antes de almoçar.

- Amor, quero ir na casa de mamãe hoje...

Mas eu era feliz, sabia e sei que era. Adorava quando, mesmo que raras as vezes, ela me pedia para massagear seus pés no sofá da sala. Vida engraçada.

Hoje, longas horas pela noite deito com a televisão desligada; sem som, sem nada. Deito e fico pensando nesta vida. Cinco meses sem Iara, e após sair para o meu sorvete, deito; deito, me cubro e fico pensando: por onde ela estará andando agora?

5 comentários:

colina coralina disse...

ah eu já tinha lido. lido e adorado. agora me lembro. realmente não se parece com vc, mario, mas sim com seus textos. gosto de "ainda há palavras lindas a serem ditas, há grandes momentos a serem vividos; nunca foram." é extraordinário de doer de tão bonito! e o título diz tudo: esse mesmo, essa mesmice, esse deixa indo assim
submisso. e como nós somos psi, não posso deixar de dizer: um par neurótico que funciona, a histérica e o obsessivo. ainda que tenham sido 8 anos...

colina coralina disse...

como psi eu diria que essa relação funcionava por ser uma exemplar relação neurótica: mulher histérica e homem obsessivo. se bem que não dura mais.. Gosto disso: "Ainda há palavras lindas a serem ditas, há grandes momentos a serem vividos; nunca foram." nem lembro mais o que tinha escrito e se perdeu, mas é bonito este seu texto, hein!?

Henrique disse...

é a única parte que era verdade, querida.

colina coralina disse...

mario, esse eu comentei umas 3 vezes pq vc disse que não tinha recebido, daí fui lá eu escrever de novo. vê se abre o olho agora e não perde mais seus comments. people loveU!

Henrique disse...

vai... comenta mais... mais...