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- O AUTOR -

Eu, Mario Teixeira.

As estórias estão dispostas nos links à direita.

Meu e-mail é: mariohteixeira@yahoo.com.br


Como epígrafe, um diálogo de Harmada, João Gilberto Noll:

'- Bruce, acorda - falo passando a mão na sua careca.
- Hein? - ele abre os olhos.
- Escuta, tenha calma, chegou a hora...
Bruce tenta sentar-se, atrapalha-se nos gestos por estar acordando fora da cama, apóio sua cabeça no meu braço, lhe digo firme:
- Escuta, tenha calma, chegou a hora...
- Eu sei, percebi; quando peguei aquela trilha esburacada que veio dar aqui, senti que a coisa estava breve a acontecer, entende?, eu poderia ter pego a estrada principal, lisa, bem pavimentada, e poderia ter
chegado amanhã à tarde, mas quando apareceu a trilha, pensei: porque não vou logo por aqui e não precipito de uma vez com tudo?
- Foi melhor, sim, Bruce... agora você já sabe desse meu paradeiro, aqui, e estamos os dois prontos, não há mais nada a premeditar, a suspender, a avaliar...
- Sim, chegou a hora, eu sei, e é melhor que já esteja clareando, olha o céu, a luz...
- Vamos, então...?
- Vamos...

Quando acordamos deveria ser o início da tarde. O sol tomava toda área de serviço. Reparei que nós dois suávamos muito. Então tocou o telefone (...)'.




Abraço...

1-O homem que comia brevidades

O Homem Que Comia Brevidades... e o seu último carnaval.

Fragmento de Carta I
“Depois que nos despedimos desta última vez, pensei em jamais procurá-la novamente... Ando sem perceber como estão ficando ultrapassados meus gestos, meu cabelo! minhas roupas e minha maneira de gostar de você. A avenida, naquele dia, me fez pensar sobre o sentido da vida, mas, felizmente, meu ônibus veio; dei sinal e corri para pegá-lo antes da arrancada. O aperto, o odor, a lentidão, misturados ao calor, sempre me dão a sensação de que, talvez, seria melhor nem ter nascido; mas pensava no seu beijo – samba em meu cerebelo e se arrebenta desfazendo-se no meu sistema nervoso. Através do vidro o que via era vazio; bateu a sensação de levitar, mas a droga de um espirro que me respingou a cara despencou-me novamente na sensação das ondulações do asfalto. Tinha fome. Tinha sede. Tinha uma velha que comeu um milho e melou o ferro justo onde eu peguei... Desci. Entre a moldura de graxa da porta rolante, metálica, enferrujada da cantina que sustenta meu apartamento entre aqueles outros vinte e nove, vi – mais por conhecer a vitrina de cor que por nitidez – as brevidades que, há muito, me tiram a fome... Enquanto esperava sem nenhum compromisso, corcunda, sentado na cadeira giratória...”.

Uma Tarde Qualquer
Quarenta e dois graus: coço, tusso, engulo as brevidades mais-ou-menos secas e calmamente os segundos vão passando. O povaréu na rua me remete ao inferno de Dante, os segundos passam... Graças a Deus eles passam. As brevidades incham na minha goela, giro com a cadeira em direção ao balcão e dou o primeiro gole na Coca enquanto olho com cumplicidade para a moça que lava a louça, sua maneira me toma, existência que desemboca numa pia de gordura... Magra, daquelas magrezas poéticas. Adoro essas magrezas. São lindas. Assim quando a pelve se destaca desenhando asas ao redor da vulva. Como uma borboleta... Debruçada no trabalho daquele jeito é como se as duas, a pia e ela, fossem extensões uma da outra. Há pessoas que a gente vê por longos períodos da vida sem saber nem de onde elas vêm e nem pra onde que vão, ela é uma delas. Um dia perguntarei seu nome. Dou um último gole na Coca já sem gás e me perco diante da imensidão do resto da tarde... Penso em dormir, mas o calor é insuportável; aí, prefiro ver televisão. Entretenimento é bom... Subo o primeiro lance de escadas e você já me volta à mente beijando aquele gordo; puta-que-pariu! Estremeço só de pensar em você subindo estas escadas comigo. Só nós dois. Brincaríamos brincadeirinhas bobas que só interessam aos apaixonados; que nos que estão passando por perto geram instintos assassinos; talvez um tropeçaria e o outro riria, baixo, bem baixinho, claro, para ninguém aparecer; subiríamos esbarrando um no outro, beberíamos cerveja no chão da sala... Volto à tarde quente ao ver um envelope em baixo da porta. Penso ser uma carta; mas não, só propaganda política. Sento, ligo a tevê, vou cedendo o corpo às voltas do sofá. Recosto a cabeça; suo, deito, tusso de novo, coço...

...Pela Manhã.
Sempre tive medo que as portas automáticas não se abram para mim, sempre comprei bombons Garoto e embrulhei em papel colorido para presente de aniversário – até perceber o quanto era ridículo. Mas até hoje, quando chego nas festas, tenho a sensação de ter na mão uma maldita caixa de bombons Garoto. Não sei, definitivamente, fazer cara de chegar em festa. Hoje faz sol novamente; a cidade fede, novamente, e minhas costas doem do sofá de courino. No espelho vejo a marca de um botão, vermelha, em minha bochecha. Merda! Ensopado. Tenho medo de você me ver agora, medo bobo, medo de que você não queira mais ficar comigo. Ficar comigo! Idiota. Porque tenho sempre que ter pensamentos idiotas? Porque a essa hora portas automáticas, caixas de bombons e ...? Idiota!!! Tomar banho, tomar banho, tomar banho... brevidades, ..., ..., fome. Brevidades. Ninguém me cheira mesmo.

- Duas, por favor. E uma Coca.

Cadê a moça da pia? Sei que ainda tenho a marca de um botão na bochecha; droga! Porque não tomei banho antes?! Droga! Não quero nada com nada hoje; que nada me encha o saco. Ai minhas costas... Cadê a moça?! Cadê minha Coca... Cara idiota depois daquele beijo. Idiota! Porque não puxei e beijei direito, sabia que pra ela era só brincadeira... Idiooooota!!! Tinha que ficar com aquela cara idiota de alegria; de quem abre um dicionário na página certa, com a mesma cara dos bombons Garoto... Droga!

- Tem Aspirina?

Voltar para casa; ai se eu pudesse desligar a cabeça... Ligo a tevê. Tomar cerveja no chão da sala... Idiota. Legal! Mickey Mouse. Televisão é legal. Amanhã recomeça o trabalho. Acho que se Mickey Mouse fosse eterno eu morreria por inanição.

Uma Pequena Descrição
Valter Máximo. Chamava-se Valter. Valter. Valter com um horroroso v e um, apenas um t. Não que desse a vida por dáblios ou por tês duplos; mas pensava desta maneira por ter ouvido seu pai, a vida inteira, culpar sua mãe por registrá-lo assim. Trabalhava numa fábrica que fazia guardanapos. Neles silkava balões, Patos Donald’s alegres, Barbapapas; às vezes só bolinhas, listras, etc... Seu companheiro de máquina chamava-se Jocicler. A cara de Jocicler era a prova, prova incontestável, de que há coisas imutáveis, completamente imutáveis no universo; ainda que vivas. Valter parafraseava Salomão: “Nada de novo há acima do busto de Jocicler”.

Valter era do tipo que ninguém vê passar. Pelas calçadas, andando, se ausentava do mundo; e para se ausentar do mundo analisava sempre, precisamente e responsavelmente, quase automaticamente, os seus próximos trinta metros de caminho; temia uma merda, um cocô. Uma possível merda, que pisaria, era a única ligação com o real que Valter Máximo tinha enquanto andava. Pensava em um dia começar andar e nunca mais parar. Andar, andar, andar, andar... Sonhava com ruas sem cocôs. Certa vez disse: “... mas sei que não há lugar no mundo para aqueles que querem começar a andar para nunca mais parar e também sei que jamais haverá ruas sem cocôs, eu sei disso”. Sempre achava que sabia das coisas.

Outra Vez, Num Só Fôlego, Disse:
“Queria mesmo é que a vida fosse uma enorme brevidade. Estática. Média. Fofa. Opaca. Uniforme. É, a grande brevidade da vida! A vida, a grande brevidade. Além do mais é barato e não é muito doce... Hum! Ela uma brevidade e eu também; seria verdadeiramente feliz sendo uma brevidade. Ser brevidade, ou ter brevidade como essência? ... Não precisaríamos de nada. Não deveríamos nada... Seriamos apenas brevidades. Ai... meu reino por uma brevidade ser. Manuel Bandeira é legal. Talvez Manuel Bandeira, Mickey Mouse e brevidades sejam as coisas que mais amo na vida”.

Sobre os Guardanapos
Odiava quando chegava em alguma festa de sobrinho e via os guardanapos embolados e sujos pelo chão. Tinha vontade de chutar o sobrinho.

Um Aparte Para Jocicler
Na fábrica:

- om dia.

- Bom dia Jocicler.

- ...

- ...

- Como foi de carnaval?

- Bom.

Jocicler era um chato; não tinha culpa nenhuma, era aquele chato por natureza. Jocicler era um dos possuidores da chatice fundamental... Quando tomava sorvete era chato, quando dava om dia era chato, quando pedia por favor era chato. Estorvo. Era feliz. E demonstrava isso sempre. Era coisa que fazia questão. Porque todo chato é feliz? Porque eles têm sempre que demonstrar isso? Pensava Valter.

Fragmento de Carta II
“... Hoje achei que estava ficando louco, nunca isto havia me doído tanto na vida. Era aniversário da mulher de Jocicler (meu amigo da fábrica) e a pior coisa que eu poderia ter feito, eu fiz: encontrá-la. Poderia ter sido ótimo... Nos despedimos e saí pensando numa bala me atravessando a cabeça, fui em busca de um Shopping para comprar uma caixa de bombons... não queria chegar de mãos vazias. Atravessei a rua e minha cabeça rodava, achava que ia explodir. Não sentia fome; me sentia como uma lâmpada, como um pneu prestes a estourar. Subi as escadas que davam para a portaria do Shopping. Alguns namorados namoravam e eu sentia asco. Fui andando devagarzinho, bem devagar. O temor da porta automática foi me tomando, eu tremia. Poucos metros e nada. Pouquíssimos metros e nada. Não queria olhar, não conseguiria retroceder: suava. As pernas bambearam. Sentia que na avenida os carros paravam para me observar; os aviões que passavam, paravam e começavam a circular ao redor de minha cabeça, me assistiam. A porta me impunha sua grandeza como jamais havia me imposto antes. Diminuí o passo. Três metros, dois e meio. Dois metros, já estava quase sem força. Dois metros e ela continuava lá; estática, fria, forte... Tudo que eu queria era conseguir parar. Não consegui. Só consegui quando meu nariz tocou levemente a porta. Parei. Queria chorar, não conseguia. Queria chutar a porta, não tinha forças. Queria voltar, sabia que era necessário. Fiquei ali, queria que o mundo acabasse naquele momento... Santo segurança, quando ouvi sua voz pensei ser a voz de um anjo. Pensei ter trasladado. Morrido.

- Meu senhor, esta entrada está em reforma. O senhor precisa passar pelo outro lado.

Não consegui sair da mesma posição. Achei que ficaria ali pra sempre.

Na verdade não sei como saí, penso que o segurança me tirou de lá. Andava, a caixa de bombos muito bem embrulhada debaixo do braço. Queria jamais encontrá-la de novo nessa vida. O ônibus até que estava vazio. Minha cabeça rodava ainda. Me sentia tão estranho que tive medo de querer jogar a caixa de bombons na cabeça da mulher do Jocicler ao chegar... Acho que eu estou ficando doido. Desci. O ponto era em frente a casa de Jocicler. Um cheiro horrível me veio. Fui procurar um pau para limpar meus sapatos antes de entrar...

A mulher do Jocicler e o Jocicler sentiram sua falta. Acho melhor a gente dar um tempo sem se ver”.

Uma Noite
Na festa comentavam que ele estava estranho. Escrevera algo e depois não conversou com ninguém. Não bebeu, não comeu... nem cantar Parabéns cantou. Ficou sentado, imóvel, meio encubucado. Achavam que ele estava passando mal. Perguntavam e ele não respondia. Ninguém ligou, ele era meio estranho mesmo. Uns achavam que estava bêbado, mas a maioria nem achava nada. Um conhecido resolveu levá-lo para casa, era caminho. Ele não respondeu que sim, nem respondeu que não; levantou-se e foi. Desceu do carro mudo, a porta da cantina estava fechada. Andava lento. Rodou por alguns instantes no mesmo lugar. Viu um papelzinho de brevidades perto da porta. Já era tarde. Começou a rodar ao redor do papel. Foi se abaixando lentamente, lentamente, lentamente... até se agachar em cima do papel. Abraçou as duas pernas. Abaixou a cabeça. Uma lágrima escorreu. Viu-se de cima, como se já não precisasse mais das vistas para enxergar. Já não sentia mais cada parte do seu corpo separadamente. Já não sentia mais deformidades ou disformidades nele. A última coisa que sentiu foi uma vontade imensa de ser mastigado... havia mudado de cor.

Pela manhã, após muita insistência do dono da cantina para que saísse dali, foi levado por uma ambulância. Ninguém soube pra onde. Permaneceu imóvel. A moça da pia sentiu pena. Após quatro horas de atraso no serviço, sentiram sua falta... Pensaram ser ressaca.

palíndromo

Só, me vês amar? Amo e bebo cínico.
- Bebe o mar, ama-se. Vemos.

passei as mãos pelo rosto

Passei as mãos pelo rosto querendo que aquele gesto me contivesse, mas não, por alguns instantes ainda olhei pra baixo e respirei fundo, mas não, tentei localizar paciência em qualquer sinapse que fosse, mas não... virei as costas e esta foi a última resposta que lhe dei na vida.

parabéns

Em frente a mim, à mesa; amiga de um amigo meu e meia chegada minha, com cara de que queria me comer, puxou o parabéns; quando a mesa ao lado encarou o canto unânime, e todo o bar; e das janelas dos prédios e casas da rua, velhos e crianças que não saem à noite disputavam espaço para suas palmas entre os umbrais, o que se alastrou pelos bares vizinhos, ônibus, cinemas, igrejas, boates, motéis, Chile, Nova Iorque, Paris, Bombaim... agradeço a todos vocês, que não sei o que faziam àquele horário (00:30 mais ou menos – horário de Brasília), mas interromperam e me saudaram: é big, é big; é big, é big, é big! Nenhuma bomba caiu sobre o Líbano naquele minuto e meio.

o artista velho

Quarenta e seis horas enrolado nas cobertas sobrevivendo de bolachas com leite ou guaraná o artista velho que ninguém conhece reconhece: eu érei.

moonwalker

Não concordo com uma pausa do que você disse, mas mesmo assim aos meus trinta anos me levantei sem discutir. Saí com meus passinhos de James Brown pelo salão e com a cabeça rodando senti fundo que era o momento de ir. Procurei como louco pela casa um par de luvas, afinal de contas, eu pensava, não é à toa que tenho um porta-luvas no carro. Chamei o elevador e percebi que precisava de analgésicos ou algo parecido. O elevador desceu em espiral. Entrei, a rua deserta, acelerei, muita coisa ficava em meu espelhinho retrovisor. Pensei, como plano, em andar marcha à ré. Mas, puta-que-o-pariu! Me lembrei das luvas que havia esquecido penduradas no banheiro. Venho, volto, faço uma baliza perfeita e passo pelo corredor como um bom moonwalker. Entro sem precisar da campainha, afinal de contas a casa é minha. As luvas lá. Agora sim. No mais me lembro que vim parar aqui. É confortável, pela janela não reconheço nem um ângulo do cenário; mas, o mais importante, sei que minhas luvas estão em seu lugar apropriado.

Agora é pedir mais uma garrafa. Quando anoitecer, procuro o caminho de volta. Enfim, sei que ainda temos muito a discutir já que esta nossa discussão é infinita, e já é hora de começar a viver mais esta dezena de vida.




Obs.: antes era impossível compreender como poderia ser tão útil esta plaquinha que se pendura na porta avisando: não perturbe. Prometo a partir desta estadia pendurar uma em meu pescoço.

mulher maravilha

Às duas da manhã, eu em frente ao computador do lado da minha cama. Pela janela me vem primeiro a Mulher Maravilha; logo após, como um raio, Marilene - minha vizinha que faz cooper e que eu nem imaginava possuir superpoderes, em seguida a Mulher Gato.

Bastou um sinal de silêncio para mim e transaram como loucas até por volta das quatro e meia.

Às cinco saíram pela mesma janela que entraram, me pedindo completo sigilo... mas, pelo menos para mim, é impossível esconder uma estória como esta.

haja

Haja, a desgraçada disse: Haja! Haja!! Haja!!!, e hoje.

era uma cidade pequena

Era uma cidade pequena, aqui do interior do estado. A tempestade um dia começou; chovia, chovia, não parou mais. Foi quando deu o raio, que por ali ficou iluminando noite e dia, com sua ponta na ponta do pára-raios. O tempo passou, despertou curiosidade. Coisas como os sinos que badalaram e estacaram num uníssono sem trégua. Zé Renato, com tino pros negócios, pintava seu corpo e como homem estátua trabalhava sob o coreto... gostavam muito de fotografar ou filmar, embora tanto fizesse, toda aquela cena. A cidade se acostumou, e de tudo aquilo a população sobrevivia com o turismo.

Eu, particularmente, não tenho a mínima saudade.

ele disse; ela disse...


Ela disse; aliás, mensagens de voz em celular servem muito bem pra esse tipo de coisa: tenho tanta saudade, muita saudade... tenho pensado tanto em você.

Ele pensa: poxa vida! Quase dois anos. É ela... O peito arfa... toma um trago... É ela! Ele pensa.

Ele retorna a ligação: poxa... e aí? Quanta... quanta saudade...

Ele fala pausadamente mesmo: ...saudade mesmo, que bom ouvir... uma mensagem sua.

Ao lado, próximo à janela, seu fila começa a latir muitíssimo alto para uma pipa que desce e sobe perto do muro e tudo se embaralha: oi, pois é... au, au! liguei mesm... au, au, au, au!

Ele diz: peraí. Bundo!!! Cala boca!!! ...oi, pode dizer.

Ela: é, liguei com muita saudade, e, sei lá... au, au, au, au! au, au, au, au!

Ele diz: peraí...

Ela diz: olha... au, au, au, au! saudade, mas au, au, au, au! o au, au, au, au! au, au, au!

Ele diz: peraí, peraí. Cala boca Bundo, cala!!!

Ela continua: queria muito m au, au, au, au! au, au, au, au, au! não dá, não dá! au, au! encontrar, mas não pense que, sabe? au, au, au, au! au, au, au, au! penso sempr au, au, au, au... au! especial... au, au! au, au, au, au! saudade.

Ela continua: pois é, preciso desligar. Saudade au, au, au! não sei se voc au, au, au, au! agora um namorado, e liguei m au, au, au, au! eijo mesmo. Tenho qu au, au, au! Beijo, beijo; especial, beijo, mil beijos... tchau.

Ele já correndo pra calçada depois de jogar os dois chinelos em Bundo tenta ligar mais uma vez. Depois de três tentativas deixa um recado na caixa postal: tenho muita saudade, muita saudade... penso muito em você... sabe? E volta descalço pra casa.

DRAMA



O menino surdo e a buzina: o menino nunca mais andou.

no bar...

- Dêem um enterro decente a este jovem e levem-me ao seu líder!

Levaram-no, e lá viveu quase sem visitas familiares durante quase trinta e cinco anos. Preferia mil vezes a ECT às amarras.

começava um solo memorável

Começava ali um solo memorável, aquele que me consagraria realmente pelo resto da vida, e que por sorte estava sendo gravado. Por sorte também, Miles observava atento e sorridente na segunda fileira, o que me rendeu as melhores críticas de sua parte. Teria sido capaz de solar aquela noite inteira, mas me deixei levar apenas uns 54, 55 minutos. Aos 15 a platéia já se punha em pé, aos 30 aplaudiam freneticamente, aos 45 tornou-se incontrolável, cadeiras voavam pelo grande teatro e havia pelo menos umas quatro pessoas em cima do meu piano. Mas, Paris é realmente uma festa que não acabou por aí; fomos então, após os autógrafos, ao quarto de hotel que Hemingway, um grande e promissor talento da época alugara, e a quem Miles insistiu que eu conhecesse.

Hemingway me recebeu com um leve soco de esquerda no queixo e disse: Rapaz, estava mesmo louco pra te conhecer. Sinceramente, depois de algum ácido que pingamos no café, achei que aquela reuniãozinha não daria em nada; e Hemingway era um chato. Tomei o primeiro tílburi e rumei para Champs-Elysées. Num café qualquer pedi uma dose dupla de vodca, num café qualquer eu era um quase desconhecido e esta sensação me agradava. Foi quando uma linda moça, com um forte sotaque, perguntou-me se aceitaria sua companhia; sua pele branca e seus olhos verdes, sua echarpe pendendo sobre o longo corpo. Conversamos por horas sobre assuntos que iam dos novíssimos seriados de tevê às influências de Stravinsky na música de Parker.

O dia amanhecia e o sol já nos aquecia um pouco pelas ruas enquanto derretia a neve. Bereszka lambia meu rosto de quando em quando por debaixo do chapéu e me dizia coisas de empalidecer Marquês de Sade. Fomos para seu pequeno mas aconchegante apartamento na periferia, não sem antes levarmos um pouco de haxixe que o taxista, um negro com traços de máscara africana e um doce sorriso, gentilmente nos ofereceu. Tomamos ainda uma última vodca antes que ela começasse a se despir.

Passamos a manhã dormindo e a tarde juntos por lugares onde apenas, e raramente, um ou outro me reconhecia. Afinal, minha música é pra poucos. À noite voltei sonolento e cambaleante para minha cobertura, com promessas de no reencontrarmos em breve. Dormi um sono pesado onde sonhei com anjas que me conduziam ao trono de Bach no paraíso.

Acordei com uma leve ressaca e uma pequenina legião de fãs cantarolando com cítaras pela calçada: salve Mario, salve Mario... cantavam como uma rebuscada paródia a música dos HareKrishna. Porra; não, não, de novo não! Mas, fãs são fãs, e merecem respeito, fui lá e sacudi minha cabeleira ainda em desalinho pelo parapeito da sacada e voltei para o café. 11 da manhã e mais um dia inteiro pela frente. Dispensei, então, todos os empregados e subi para o terraço, tirei aquela tarde de folga. Paris é decididamente uma festa.

pela décima vez

Pela décima vez: Não quero mais que isto aconteça!

Sabia que ia bater, de canela, de novo, ainda assim fui. Ferro no roxo! Puta-que-o-pariu!

Ter que comprar caneleiras, não quero, não quero mesmo; já até experimentei, são péssimas para andar.... e será que precisava daquele gritinho ridículo: aaaai!

E ainda tem o pior, o troço é bem chumbado. Só mesmo um órgão oficial para fazer uma coisa assim..., mas, às vezes, penso que pode mesmo nem ser culpa dele, como já me argumentaram: Ninguém mais bate, só você. E sempre de canela.

E se eu mudasse de cidade? (...) quando chega a hora, dá vontade de nem sair de casa, ficar quietinho; mas preciso. Aí tremo só de pensar. O medo é até de ter filhos, não quero que o mesmo aconteça com eles... pode ser genético, ou algo assim.

O segurança, tempo atrás, amarrou uma borracha lá, mas borracha de pneu e não adiantou muito. Nesta época ele até virava o rosto quando me via chegar; agora parece que nem liga mais.

Qualquer dia consigo, sei que vou conseguir. Talvez no céu não haja disto, talvez eu arranje um meio de permanecer em casa, talvez destruam este lugar, sei lá...

O fato é que não aguento mais!

sob a lua

O corpo coça em três pontos diferentes;
e eu aqui, preso entre as ferragens.

menino feio

Menino feio que fui, nunca aprendi a dançar, tanta feiúra não dava alento ao movimento como forma de expressão; menino tão feio também não tinha par. Menino feio que fui, tentava de tudo com meus cabelos, e tudo que conseguia era risos até da professora; o que dava era para encrespá-los para um lado. Menino feio, mas tentava melhorar com perfumes e desodorantes; o que já imaginam só piorava a situação. Menino feio que fui tentava muito me superar com as notas do colégio, mas meio burro também, não serviu como alternativa; era a média e pronto. Poxa vida, menino feio com uns duzentos apelidos. Menino feio e burro que fui, virei literato cabotino; e estudo calmamente o dia em que me tornarei o assassino de Francisco Buarque de Holanda.

na serra

Na serra, um sol, um suco e a criança pergunta: Pai, vamos ver quem morre primeiro?

empreitada

Ela estava na cama, ouvindo Nirvana, pra quem conhece por nome: Milk it. Lá, esperando o namoradinho telefonar, sempre à mesma hora.

Ele não foi nada gentil ao abrir a porta, nada parecido com quando assentava os azulejos da reforma do banheiro.

Escondeu a calcinha desenhada por desenhos nas cobertas. Não entendeu, não disse nada, ficou olhando... Mãos duras em cada ombrinho, mas desta vez gentil, como um pai, e ela se deixou virar. Bundinha pra cima. Ela sentiu calada.

O namoradinho, o telefone tocou, à mesma hora; não atendeu. Não atendeu mais, dia após dia, não tinha graça. A mãe chegava do trabalho e não podia compreender como era possível uma empreitada já paga durar assim, tanto tempo.

levada da breca

Levada da breca... essa sim! Janota aquela manceba. Guria batuta. Peralta que só ela, patuscadas de monte; e com todas suas traquinagens não havia quem titubeasse em sapecar-lhe safanões ou um daqueles piparotes. Como pode ser?!

Mas, certa feita, numa de suas garotices, pirilampeou para o lado de Amílcar, o velho do armazém. Pra quê... ô infante brejeira, tamanho pito levou, seguido de uma lapada na fuça, que desta pândega em diante saiu escoando pelas frinchas e não houve mais quem a visse pelas bandas aprontando alguma das suas.

Chuchu beleza.

FAROESTE

O grande Cowboy atirou o fósforo como um bumerangue em direção à vela, que após um contorno circular perfeito voltou aceso em seu cigarro.

ovo

Te ponho para sempre pra fora
como um ovo
não incomode mais!

meia hora de conversa

Meia hora de conversa com intervalos

Uma benção, e não ter nem quebrado o nariz um milagre. Não quebrou o nariz? Por milagre, pelo mau jeito da queda. Estes assuntos me assustam. E se fizerem cócegas, meterem giletes na sua boca ou enfiarem sondas sujas nas suas narinas. Pois é, pra quem após assistir à queda riu e rodopiou. Artífice... Mais do que você consegue temer. Artífice mondongueiro. Não podem ver uma mulher grávida e logo tentam seduzir, o mesmo pediu a filha em casamento... Mondongueiro! E na quinta vez que se viu encurralado, ordenou à sexta que não existisse. E nós aqui, só o que dá pra fazer é torcer para que tenhamos braços quando a rasteira vier. Passar rasteira num homem sem braços, que já tem problemas por gripar demais. Quando gripa sente vergonha até da família. Um homem só com ombros. Tudo que deu pra fazer foi arquear a cabeça para trás.

­- Garçom, traz mais uma, por gentileza.

E aquela mulher careca que deu pra morar dentro das piscinas. Já perdeu todas as unhas. Já perdeu todas as unhas. Ainda com aquele cachorro sem pele. Que prazer é esse de fazer boiar os afogados... E a gente aqui, tudo que dá pra fazer é torcer para que não haja mais piscinas. Ainda se ela fosse menos enrugada e o cachorro menos violento. Ou se não lambesse os pés das crianças. Sorte é que o cachorro é sem dentes. Nem tudo é tão ruim. Palhaços me mordam.

Começou a chover. Chuva bem forte. Vento de chuva é bom, quanto mais neste calor... você sente saudade dela? Só do cheiro do cigarro e de como tocava bem bandônion. Dar rasteira num homem sem braços... Ela acariciava meus cabelos. A vida passa e a gente nem percebe. A gente não sabe em qual desvio perdeu o caminho e nem sabe onde foi que começou a descer. Eu vou levando... Cerveja. E uma vida leva tempo... Principalmente quando não se é atropelado por um ônibus. Ela era uma boa companhia. A cerveja não está gelada. Ela deve estar. E eu também, me abraça... Dorme na minha casa ou dormimos na sua. Não durmo, muito obrigado. Podemos, então, num destes lotes vagos... Depois da saideira.

- Garçom, mais uma, e um Campari, por gentileza.

Este mundo é estranho. Palhaços me mordam...

papai noel-1

Papai Noel do shopping numa terrível dor de hérnia seguida de febre alucinou ser o Bicho Papão.

papai noel-2

Foi aos Correios e pegou umas das cartinhas destinadas ao Papai Noel; datou e respondeu com letra bem redonda:

‘ Papai Noel não existe, existe é o Bicho Papão. E à meia-noite na véspera ele vem te pegar...’

churrasqueira

Ela sentada com Carlos nos degraus da varanda. Ele cuidando da carne pensando seriamente o louco desejo de passar sal grosso, espetar e colocar seu coração na churrasqueira.

cadê ela

cadê ela?
cadê ela?!

cá, choro.

cadela!

poeminha

É assim, entendi.

Mas fiquei puto, confesso. Agora relaxei; e desta vez não foi pra boca do gato que sobrou, não foi a boca do gato que chutei. Dei mesmo foi no canarinho, com um alicate de unha, delicado, em uma e outra perninha. Soltei, voou.

Então deitado, no momento penso: será que o pobrinho pousou?

toc, toc...

Bati na porta; toc, toc, toc; toc, toc. Esperei, a porta não abriu, não fui atendido, mas sabia que havia gente por lá, a música do seu vinil preferido por estes dias estava tocando na sala; pensei inteligentemente: vinil é curto. E esperei mais, a última música, e o vinil acabou. Então fui e bati: toc, toc, toc, toc, toc. Ninguém atendeu. Grande filha da puta! Eu disse. E sentei no boteco em frente.

Um conhaque, qualquer um, e uma cerveja, qualquer uma, gelada. Eu pedi.

Grandessíssima filha da puta, abriu a gretinha da cortina, me viu sentado, e fechou rapidinho. Deixei meus óculos escuros sobre a mesa como garantia pro senhor que me serviu e fui lá. Toc, toc, toc; toc, toc. E voltei pra minha mesa sem sucesso.

Dadas cinco, seis horas de espera, paguei a conta, voltei até à porta e toc, toc, toc; toc, toc. A porta se abriu e olhei fundo nos olhos, praticamente só deu tempo para vomitar no tapete. Ô... peraí, peraí! Eu disse. Mas, filha da puta! Filha da puta! E eu já estava na rua ouvindo os trincos da porta, e depois voltando pra casa.

estátua

Eu fico aqui, blá-blá-blá, blá-blá-blá; porra! Falando, falando pra seus olhos parados, e você aí, porra! Como se fosse de gesso.

E eu falava, falava, gesticulava! Andava, chutava. AI!!! Caralho! Olha, não dá mais, não dá mais e minha mão incontrolável acertou com todos os dedos orelha e bochecha. Você está me deixando louco! Você está me deixando louco! Eu gritei enquanto ela caia no chão da sala e, enquanto junto com seu anel de vidro se quebrou para debaixo de móveis, televisão, corredor, sofá...

ele começou a chorar

Ele começou a chorar, eu olhei fundo. Ri, e disse, gritei: Chora! Chora, porco!!! O porco chorava. O três oitão atochado naquela têmpora que se mostrou tão frágil. E ele me olhava de banda. Chora filho da puta!!! O bosta ainda veio me pedir perdão, mas não completou, por minha sorte calçara meus sapatos com biqueiras de ferro que arrebentaram seus dentes da frente; acho que fodeu sua língua também. Aí os esfíncteres desabrocharam, e não deu mais, tive que apertar o gatilho, duas vezes, uma homenagem a cada esfíncter, não era minha obrigação continuar sentindo aquele cheiro. Mas ainda havia vida na casa, eu ouvia, corri nos canarinhos; um dos desgraçados ainda tentou bicar o meu dedo, com um alicate de unha cortei uma a uma as perninhas dos três, e fui soltando na frente do gato; o gato só morreu depois de muita vassourada. O peixe não, o peixe morreu rápido, numa chaleira em fogo brando, era um Betta. E eu já ia saindo, mas num último detalhe, travei o spray de inseticida no corredor que dava para todos o cômodos, era para ter certeza de que nada, absolutamente nada, deixaria pra trás naquele barracão.

digno de ódio

Cada dia mais tenso e digno de ódio, afinal de contas que graça tem, que graça tem acordar e passar o dia. Alimentar pra viver, ser fiel, ser fiel, tirar pó, o pó, ganhar dinheiro, ganhar dinheiro, acordar, dormir, acordar, dormir, acordar. Vontade de entrar de sola para fora da janela. E como vai a cor do seu cocô, rapaz? Você emagreceu bem; queria que fosse tão bonito quanto antes quando ficava nu. Como vão seus intestinos? Como vai o tônus muscular? Cuidado, você já está quase sem amigos, você está cada dia pior, as costas entortando; poucas pessoas ainda têm paciência de tentar entender você. Eu amo, amo você e quero que esteja bem nos próximos 20 anos pelo menos; mas não vamos nos ver mais...... Cuidado com os comprimidos... É, cada dia pior, cada dia pior, cada dia mais lamentável e desprezível. O cachorrinho quer que coce a barriga, a família quer porque quer atenção, e o infeliz bate a cabeça na parede. A cabeça quer sair pra não voltar. Afinal nada mais besta que fazer tudo funcionar direitinho, direitinho. O bebezinho chega. A cada dia que passa, mais anti-social e tosco. Afinal quer coisa mais nojenta que um bebê? Aquela coisa onde todo mundo beija, cheira, baba, passa a mão, um beija mole, outro acaricia, outro beija por cima. E o sorvete na mão da irmãzinha mais velha me lembra o filho que abortei e me tem voltado pelas manhãs em imagens estranhas. Cabeça de vagina sorrindo, às vezes na barriga de uma lagartixa, outras em espiral num bueiro, se masturbando na beira da cama. Só um sorvete, só um sorvete, só um sorvete. Passo a passo mais próximo a uma coisa horrível, que morde, que não gosta e não gosta mesmo, cada dia mais dentro de um livro escrito por Kafka. Cada dia mais sem o grande final.

a beleza de beatriz

Unânime a beleza de Beatriz, que na vida viveu todos os prazeres possíveis, por todos orifícios cabíveis, preenchendo todos os vazios, com todos elementos viáveis.




Ontem não resistiu a uma traqueostomia.

formiga

Aqui em casa tem dado muita formiga, por todo canto. Se ajuntam nos pratos se por um instante na pia. Muita formiga, talvez porque não tenha sido só um instante, talvez por ter passado as últimas semanas sem lavar estas louças. Vêm de todos os lados e chegam a entupir o ralo. Formigas são bichos danados, maiores ou menores, a metade das minhas orquídeas já foi embora. Fizeram casa na TV, e nos outros todos eletrodomésticos que esquentam; não sei, talvez porque há semanas que não desligo. Gostaria que parassem de entrar em meu conhaque, mas formigas não têm limite. Tento espantá-las da cama, mas não está funcionando, nem com todo fumo queimado que espalhei pelo colchão. Será que é pelo tempo que estou aqui deitado? Não sei, sei que preciso dormir, o que está cada vez mais complicado, dói este buraco que começam a fazer na minha canela.

eu

A idéia é que os cacos de todas garrafas que já bebi se tornaram matéria de novo aqui por dentro de mim, espremendo. E pra cabeça toda fumaça fumada foi revolvida. Parece que todas mulheres que já estiveram comigo grudaram como outra forma, gosmenta, de cera, sei lá, pela pele toda; a pele quer transpirar, mas não dá, os olhos ainda conseguem ver. Voltou o cansaço, acumulado, das noites não dormidas, uma por uma. No final das contas me formei um monstro de mim mesmo. Por sorte ainda tenho meu amigo imaginário, pena é que de dois em dois minutos ele insiste em apertar a ponta do meu nariz.

2-Às seis da tarde

Às seis da tardeou moto-contínuo



Acordo


O relógio despertou às seis da tarde, e eu sem saber bem o que fazer. Sabia que acordar era preciso; o difícil, agora, é saber por quê. Fome misturada à ansiedade. Corpo pesado. Tudo no lugar: copos, cortinas, livros, retratos, pó... Talvez ir à banca, ver TV... Ligar para alguém. Não. Meio cansado de mim, mas querendo ainda algo. Vitamina de banana. Seis da tarde é das horas a mais sem sentido do dia, creio que não haja pessoa que faça algo útil às seis da tarde. Ligo o radinho: “Dorme o sol à flor do Chico, meio dia. Tudo esbarra embriagado de seu lume. Dorme ponte, Pernambuco, Rio, Bahia. Só vigia um ponto negro: meu ciúme”. Tempo fresco, tempo parado; um ou outro barulho de ambulância, de vez em quando. Um ou outro avião que passa de vez em quando...


Ela

A mulher da janela em frente sai do banho, começa a abaixar a toalha, mas vai pro quarto; mais uma noitada. Geralmente volta às três ou quatro da manhã. Quando estou em casa costumo vê-la chegar. Gostosa. Chega mole. De sapatos na mão... A primeira coisa que faz é tirar o vestido; deve ir a boates chiques, nunca a vi sair de calça à noite. Não entendo o porquê de tirar o vestido se o que aperta é a lingerie! Mantém calcinha e sutiã até entrar para o quarto, que é quando não a vejo mais. Toma Coca-Cola, ou alguma outra coisa que tira da geladeira, come algo e vai dormir. Nunca, que eu me lembre, abriu as cortinas do quarto.


E Eu, Que Nem Esperava Você Ligar; Queria Que Me Esquecesse Para Eu Esquecê-la Também

Seis e meia; no radinho: “Nosso amor não deu certo, gargalhadas e lágrimas...”. Quinze para as sete. Sete. Escurece. O telefone toca. Tento manter o controle da voz, mas com você do outro lado; impossível. Rádio: “Aqui tudo parece que é ainda construção e já é ruína”. Desbaratino; com você o oco sempre vem junto. O oco. Fico sem querer falar. Chato, falo pouco e curto. Silêncio. Oco... Pouca conversa. Para. Não enlouquecer. Beber.


Ela, O Frio. Saio

Sai pronta do quarto; vestido verde musgo: veludo. Bela ela... Esfria, visto a jaqueta e a touca, e saio pouco depois d’ela sair.


Ele, Marbel e a Adição

Corro, tenho pressa. Encontro com ele, justo ele. Despeço logo. Com promessa de nos reencontrarmos em breve... Boa pessoa ele, ele. Pena que não bebe, Marbel também não; não fuma, não bebe; nem carne come. E eu nessa. Penso em quanta porcaria já passou por minha boca nesta vida, mas continuo. Estômago e pulmão, e língua são como bombas dentro de mim; vivo prestes a detoná-las de vez. Qualquer dia acabo me fodendo nessa. É. A cabeça começa a rodar. E eu continuo... talvez algum dia eu pare, será bom se eu parar, vou ser igual a ele e Marbel.


Pensamentos e a Rua

Bem ao certo, não sei quanto tempo passou desde que saí. Saí e meu dinheiro ainda não acabou, que bom: gramas, ml’s, recortes... Sei que o movimento do passeio nunca me enjoou tanto quanto hoje. Sempre suportei bem, e hoje, ando perdendo o equilíbrio... Sei que preciso tomar um barco antes que seja tarde demais. Não encontro nenhum barco. Nenhum. Penso; penso, penso. Sem concluir.


Um Haikai

Sexy pra cacete

Até seu espirro...

Falta-me o verbete


Acho que eu deveria parar e voltar para casa, mas não quero. Escrevi este haikai num dia em que saímos e você estava gripada... parar é para quem pode, não para quem quer.


À Rua, De Novo

À cada momento o equilíbrio se torna mais precário. Merda de rua frouxa. Por detrás dos edifícios, transatlânticos. Os peixinhos japoneses aparecem eufóricos embaixo dos meus pés. Beliscam enquanto paro. Me seguem enquanto ando. As ondas começam a crescer, tropeço; o mergulho é inevitável. Que gostoso!.... Vou até ao fundo e não tenho vontade de voltar. O bom é ver as pessoas de baixo. Tão, tão feias. “Atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu...”. Percebo que pessoas que eu não vejo há anos estão todas lá, se divertindo. É, que bom! À tona, falta fôlego. As ondas diminuíram, me alegro. Passo em frente à padaria. Compro um pão. Do lado do meu prédio. Preciso sair; é tudo que sei. De novo só sei de uma coisa. Saber uma coisa só por vez é bom. Sem dúvida nenhuma. Vou.


Encontro Com Kafka!!!

Eu com o pão... sem mais fome; Kafka vem cambaleante: só pode estar bêbado. Kafka vem cambaleante, e, com ele, rárrá, Gregório e O Artista da Fome; um bom final para o meu pão. Kafka, como sempre: simpático, agradece. Só pode estar bêbado. Sempre encontro com ele nestas situações.


Bar É Bom, Mas Prefiro Andar

Bar é bom, mas prefiro andar. É de soslaio que as pessoas me olham, a vontade é de mergulhar de novo. Enquanto as horas passam, vou enfiando porcarias boca adentro. Lembro do seu beijo e o pinto arranca um meu pentelho. Merda! Sei que preciso parar, uma hora pararei mesmo... Mas não paro. Não paro. Sigo e já não encontro com ninguém; nem com ele! Ai se eu encontrasse Marbel. Você, à esta hora, já deve estar bebendo com outro; melhor mesmo eu não entrar em nenhum bar. Menos arriscado. O que tenho ainda nos bolsos, e a padaria, creio me serem suficientes... e a rua do Índio é logo ali, lá consigo mais o que precisar. “Tinha receio do frio, medo de assombração. Um corpo que não mostrava, feito de adivinhações. Os botões sempre fechados...”. Que mistério teria você, pra me deixar nestas condições?


Chuva

Que beleza; chuva!!! Assim esperto um pouco... Talvez um bar; um bar, um bar... Talvez não. Que porra!!! É essa possibilidade de, merda!!! ver você em algum lugar. À padaria... Merda de padaria fechada... fechada de quatro às seis, para a limpeza. Droga de padaria esquisita! Nervoso, sozinho e chovendo... pensar que um bar agora é minha última solução. Marquise para pensar, e um Mirabel que comprei na padaria mais cedo. Doce é bom.


Ao Bar

Mais calmo... vou ao bar, o melhor é ir. Quero mais. Não quero parar. Esperar um pouco até a chuva diminuir... e a chuva aumenta. E o tempo passa. Passa o bastante para a padaria abrir às minhas costas; o dia amanhece, e eu. Quero. Mais. Seis da manhã.


Por Quê?!

Quando bebo é para completar sua ausência em mim, filha da puta!... Bebê-la seria o ideal. Por quê?! Na padaria: “... tua presença, entra pelos sete buracos da minha cabeça...”. Sempre toca música boa nesta padaria... Seis e pouco da manhã; sinto vergonha, e um pouco de sono. Mas não paro. Volto à rua. Recomeço.


Trinta Agulhas Que Foram Muito Barato

“Trinta agulhas é um real! Trinta agulhas é um real! Trinta Agulhas é um real!”; compro trinta agulhas por estar muito, muito barato; chego a ter pena do rapaz que me vendeu. Trinta agulhas!


Continuo

Continuo.


Final

Seis e meia, sete, sete e meia. Tiro a touca. Oito, nove. O estômago queima tanto quanto o sol e o sol queima muito. Muito, muito sono. As coisas vão se tornando acumulativas. As pernas desobedecem, muito pelo cansaço. Preciso. Voltar. Não, quero. Mas... Em casa, o telefone fora do gancho; a mulher da janela em frente com as cortinas fechadas, o copo do liquidificador com o resto da vitamina já escura. Você um dia reclamou do barulho que o despertador fazia; um simples tic-tac bastou para você reclamar. Sei que logo não a quererei mais, aí talvez você compreenderá... É o mesmo despertador que agora eu regulo para despertar às seis horas da tarde... é o mesmo que coloco para despertar às seis horas da tarde. Às seis horas da tarde. Às seis da tarde. Me parece uma boa hora para acordar.

o menino mole

O menino mole – 1
No dia em que seu primeiro dentinho caiu, deu pra mascar até que perdesse o gosto.

O menino mole – 2
Ganhou de presente uma Amoeba, mas não viu a menor graça.

O menino mole – 3
Coradinho, numa crise precoce de identidade gritou ao Danoninho: Porque não fala!

O menino mole – 4
Nada fácil a sua sina, certa feita comendo um puxa-puxa se deu conta que meio mindinho já tinha ido embora.

O menino mole – 5
E de tão dura que lhe era a vida, desistiu, um dia deitou-se e derreteu.

luzia

Não acredito que aquele cafajeste me comia; Luzia pensava enquanto chupava o pau grande do traveco Leonor. Leonor pagava bem; o cafajeste Waldete nunca dera um puto e por cima dividia barraco. Não acredito que aquele cafajeste me comia! Pensava Luzia. E Waldete, Waldete pegava a filhinha toda noite, filhinha de Luzia; Joanna, Joaninha. Até que, Luzia viu. Puta que pariu! Não acredito que até ontem aquele cafajeste me comeu; pensava Luzia, enquanto mamava, em Leonor, feito uma louca.

me lembro do seu sapateado

Lembro-me bem... do seu sapateado batendo com seus cascos nos tacos. Conversávamos? Tentávamos, mas de sua voz fininha e fala rápida, de seu vocabulário baseado em ‘i’s e de sua língua de calango pouco se entendia. Essa língua de calango ele gostava de, com extrema rapidez e suavidade, percorrer pelas duas narinas de meu bebê enquanto o pobrinho dormia. E sempre grandes estoques de papel-carbono pela casa, sempre à mão, tinha muito apetite e era do que se alimentava. E porque tudo isso? Medo. Lembro-me que poderia ordenar aos ossos que se quebrassem, e eles se quebrariam.

ela era daquele jeito mesmo

Ela era daquele jeito mesmo, e eu aceitava. Abaixava a cabeça e respondia: sim. E foi assim durante bons oito anos. Como exemplo; havia ocasiões em que eu chegava do trabalho, mal me assentava, ia à padaria buscar seus cigarros que já estavam no fim, era o que ela desejava e o que eu queria fazer. E eu a amava, era como um ofício; reconheço pequenas barreiras, mas eram barreiras a serem vencidas. Pra passear, o que ela gostava, e só do que gostava, era a visita a sua mãe; não que na volta eu deixasse de convidá-la para um sorvete, sempre convidava, mas ela, sempre muito cansada, me mandava parar na padaria e comprar um pote e aproveitar para comprar o pão e o leite.

Ainda há palavras lindas a serem ditas, há grandes momentos a serem vividos; nunca foram. Quando Iara não estava lendo algo, se interessava pela tevê. Não, não era ruim, eu a amava e amava mesmo, isso era o que importava; mesmo de três anos pra cá, quando saiu de sua forma ideal e já não tinha mais quase nenhuma beleza física; andava suando muito, por qualquer mínimo esforço, consequência da sua vida sedentária.

Sábado de manhã eu saía pra pelada com os amigos, rotina, e nunca me atrasei para o almoço que eu mesmo trazia. Chegava cheio de saudade. Geralmente Iara estava acordando, e consequentemente fumando.

- Vamos amor, lava este rosto, vamos dar uma caminhada e tomar um ou dois chopes antes de almoçar.

- Amor, quero ir na casa de mamãe hoje...

Mas eu era feliz, sabia e sei que era. Adorava quando, mesmo que raras as vezes, ela me pedia para massagear seus pés no sofá da sala. Vida engraçada.

Hoje, longas horas pela noite deito com a televisão desligada; sem som, sem nada. Deito e fico pensando nesta vida. Cinco meses sem Iara, e após sair para o meu sorvete, deito; deito, me cubro e fico pensando: por onde ela estará andando agora?

barata

pela verga superior da porta de entrada, pelas ombreiras unidas, pela lindeira, uma lagartixa carregava desistindo uma torporosa barata pela cabeça, que pendia o corpo por um fio.

observando até que sumissem em sacrifício mutuo pelas frinchas do forro laqueado (para que ficasse mais bonito), lembrei (e chorei) de como andamos nos entendendo pelos últimos tempos.

AVENTURA



- E agora! Como irá o herói se livrar desta enrascada?!

- Uh!!! Céus!

- Macacos me mordam! Essa, sim, os deterá.

maria inês

Maria Inês era poeta, sobretudo, poeta. Fora professora, então aposentada, residente numa casa simples ao final da ruela Castro Alves. Pobre Maria Inês, acordava sozinha, preparava seu café, tomava sozinha, cuidava dos gatos, varria as folhas, ia à venda comprar as coisas para o almoço. Almoçava sozinha. Suas tardes variavam um pouco, mas quase sempre lia, escrevia. Escrevia em cadernos de arame com letra redonda e cursiva.
Maria Inês não era nada bonita, nem na infância. Não lia poetas sujos ou desbocados, os de mais carícia, lia centenas de vezes. Tentava assunto na fila do supermercado, ia sempre pras filas maiores; tentava assunto nos ônibus, pegava os circulares. Maria Inês poderia ter sido freira, mas não, era poeta, sobretudo poeta. Maria Inês achou que seus cadernos ficariam para posteridade, mas após uma leve folheada nos três primeiros por um parente distante foram parar na fogueira do quintal junto com seu colchão, travesseiro e outras coisas.

lu-10

final

Volto, e subo os dois lances de escada que não se desdobram, mas na minha cabeça se desdobram, vou à janela e Luciana não está, claro que não. É um sábado de manhã e a rua está vazia, mas têm alguns passarinhos se secando no fio de luz, eles se secam das poças de água da chuva que já era. Luciana, tudo que queria: que eu pudesse ser uma pessoa mais ou menos normal, mais ou menos, que não tivesse deixado a vida entregue à bebida e descrenças que não passam de fantasias tão bobas quanto são as crenças mais bobas. Penso em ligar, mas não, eu bêbado. Luciana, como poderia minha filha depois de todo passado ainda me amar, assim.

lu-9

9

Filho da puta! (a água que o garçom lava o salão molha seus pés e ele dormia, o dia que amanhece e ele com o bermudão e os chinelos de ficar em casa), porra! (ele só tinha encostado a cabeça uns vinte poucos minutos), caralho! (seu celular já não estava mais na mesa, só o guardanapo com o palíndromo), boceta Luciana! - Revelo que Luciana foi mesmo pra casa da mãe e agora está tentando falar no seu celular que já está de chip trocado; ela fala: é um bosta mesmo... (e, coitado, ele é um bosta mesmo).

lu-8

8

Mas tudo bem, tarde já, amanhã sábado, amanheço aqui, cedo sigo.

lu-7

7 (ou um palíndromo bêbado para Luciana)

Será Lu em mim, meu? Ou, em mim meu lar és?

lu-6

6

‘...sou uma gota d’águaaaa, sou um grão de areiiaaá...’ Muita música boa nesse bar, ‘...você me diz que seus pais não o enteendem...’ Ai, Luciana, o que você vai ser quando você crescer? Será; será que ela foi pra casa da mãe? Será? Garçom! Outra, e um picado... Hum..., maravilha! que beleza de novo... ‘...hoje a noite não tem luar, e eu estou sem eelaaa, já não sei onde procuráaar, não sei onde ela está...’

lu-5

5

Como eu pude ser tão fodido! Como eu pude ser tão escroto!

Moço... mais uma, e uma cachaça.

lu-4

4

Mas nada é tão fácil, fácil é se sentar e tomar cerveja, é o que faço. Peço também uma cachaça que é a companheira da cerveja.
E Luciana gravita por ali, eu uma deformação do espaço.

lu-3

3

Sigo, atrás de Luciana, como se só me faltassem sempre dois lances de escada, e que vencidos ela me dissesse então: eu também te amo, que bom que você veio!

lu-2

2

Luciana não atende ao telefone, não atende ao celular, e eu como um pitfall pelas poças, entende? E eu cansado, clichê, de bar em bar. Quando ela me disse aquelas palavras duras, eu torporoso por suas palavras não consegui me levantar, e foi este momento de torpor que colocou dois lances de escada entre nós.

lu-1

1

Por onde andará Luciana, passo rápido pelas poças e já é noite. Ela não me ouviu quando eu disse (eu te amo, espera!) pela janela do meu apartamento; corri pelas escadas, ela já não estava mais e a chuva recomeçava de leve.

à noite ela se acorda

À noite ela se acorda, remexe, e diz: ai amor... amor. Diz baixinho. Amoor... Escuto e finjo que não, o dia foi longo e sei que Maria Alice só se levanta depois do meio-dia. Durmo leve e Maria Alice revira, e se encosta devagarzinho. Encosta, e eu durmo de novo. Acordo, com o leve rebolado, ouço o suspiro que é forte. O shortinho é seda. Ela rebola e eu fingindo, continuo. Ela sente. Ela entra pelas cobertas; já posso abrir os olhos. Boca, às vezes melhor que... Ai; amor! Maria Alice diz, agora alto, entre dentes e membro.

Eu sei que só acordará depois do meio-dia; quanto a mim, daí pra frente, só cochilei mais uns trinta minutos antes da barba e do banho. Ao meio-dia e quarenta liguei pra casa, ligação de celular, foi só para dizer: princesinha, sabe já que eu te amo também?

miles, 21 de setembro

Miles, 21 de Setembro

O acorde descansa enquanto eu não consigo dormir.

cama limpa, cigarro e vela, e a vida é isso que eu tenho agora. como idéia inicial atravessar mais um dia, e me parece tão comprido quanto as suas pernas. outro acorde tenso recomeça, nada é perfeito além do atrito da parede e do colchão. um cachorro late, um galo, o quarto, a janela e as bananeiras no lote vago e ao vento crescendo as bananas.

Miles Davis – Kind of Blue.


Obs.: esta foi a última noite em que você dormiu na minha cama.

3-O lugar

SOBRE O LUGAR, ELE, COMPARAÇÕES, APOSENTADORIA, O BURACO, UMA CARTA, EDIFICAÇÕES, UM MONTE, LAGARTIXAS ENTRANDO PELAS NARINAS, PARAFUSOS, PORCAS E O FIM

O lugar, na forma, um pau de bodoque; uma passagem dando em duas, entre duas avenidas... e as pessoas ali, a maioria torta ou mal formada: cotidianamente... O beco em Y. Barracos altos, uns por cima dos outros, e uma trilha de céu acima. O bar no vértice. O beco... Cachorro, cachorro, muito cachorro. Ratos, famílias. Cachaça, aneurisma, cafeína, calafrio. Cirrose. Muito riso... Muito arame farpado de varal, muito caco de vidro de ponta pra cima... portas abertas, gente nos marcos. Fraldas nos arames farpados.

Mas não existem comparações entre vidas.

O beco; a fé, a cachaça, o amor: que não consegue ser correspondido, não consegue ser correspondido, não consegue ser correspondido... o esgoto a céu aberto... era assim.

O beco.

Os horários, lá... repetiam-se: os que vêm do trabalho, os que se encontram no vértice, os dias de culto... a igreja. As madrugadas que ninguém vê com os bêbados dormindo no chão; o frio, as quinas. Pouco se sabe. Destes lugares pouco se pensa sobre. Lugar dos que rejeitam raciocínios a respeito. O beco, parece um lugar que não quer existir. Existe pouco.

Na terra: muita guimba de cigarro. A tosse das crianças, sem parar. E porrada com sangue.

O céu: para lá, poucos dali olham.

E o beco.

A igreja que grita de 7 às 10 e meia. Tutaméia. A cachaça vai para os estômagos a todos os momentos. Ai, ai, ai. Noite à noite naquele bar os demônios rodopiam; enquanto na igreja os anjos descem. Os demônios rodopiam enquanto na igreja descem os anjos... Os demônios rodopiam enquanto descem os anjos. O beco em transe.

Ele: não agüentava mais aquela aposentadoria, não queria nem poderia trabalhar, aquilo era muito estranho... e aquilo era tão estranho que não houve coragem para contar para ninguém. Por muito tempo não se importou. Só quando vazou foi que incomodou: o frio. O frio. E nas tardes quentes o quanto queimava. O espaço no lugar do peito.

Mas não existem comparações entre vidas...

- Aposentado por insuficiência respiratória. Sempre fumou muito.


Um buracão, ali, que já estava quase no gogó; ao primeiro terço do intestino. Para os outros só usava lãs rulê grossas. Lá ninguém havia ainda percebido. Menos nove quilos já calculados, e o vento gelado da brecha do basculante enquanto tomava banho, atravessando... Pensa o quê debaixo do sol, Abaporu?!! Era a pergunta.

Sem você o meu mundo ficaria completo.

Nas tardes quentes, gostava de ir ao alheio. 30 a 40 minutos de ônibus, mais um tempo a pé. Origem-Destino. Um monte isolado a que chamava alheio... tirava sua blusa para sentir a brisa refrescar aquele grande orifício tão redondinho, aquele espaço que quase nunca tomava sol; e o vento. O vento. O vento... Guimarães!!! Alheio.

O buraco.

Algo que preenchesse aquele espaço. Mas prótese de peito?!




O lugar.

A paisagem, Miró; as edificações: Kandinski e as personagens Picasso. O enredo...

(É normal, as pessoas fragmentam-se, geralmente em 42 pedaços. Misturam-se por magnetismo e assim lhe chegam; com dedos na testa, orelha no peito, nariz no queixo. E assim por diante. As edificações seguem o espaço, o respeitam. E o enredo...)

- “Há um leão lá fora, serei morto por ele”.

O beco. Entrada de porta de casa que dá na altura do peito. Entrada de porta em que se abaixa para entrar. Não tem o dinheiro para o condicionador. Cesta-básica. O sol só desce todo ao meio dia. E o esgoto a céu aberto... ai. Mulherada quase nua. Muito sexo pela tarde. O esgoto a céu aberto. Briga com faca de casal num cômodo único com fogão e cama? ...e o esgoto a céu aberto. E tudo é muito grande. O beco é fino. A música é alta. O beco em Y.

- Pensa o quê, Abaporu, debaixo do sol?!


O buraco.

Ele, de fumar qualquer coisa já havia parado, já não dava mais barato nenhum. Desde aquilo tinha perdido a vontade também para coisas grandes, até de conversar com os outros já havia perdido a graça. A aposentadoria lhe bastaria pelo resto da vida, sabia disso. Ambições, ...; e então? Já por volta dos quarenta e cinco e ainda nada, não seria agora. E o seu buraco. E o seu buraco. Mas havia a sensação de que alguma coisinha ainda faltava. O quê?! Pensava e pensava muito, não com paciência para uma coisa só por muito tempo. Ficava não querendo pensar.
– Porque não foi este buraco na cabeça!?


Mas não existem comparações entre vidas.

O buraco.

Uma carta que estava na mesa ao lado de fotos, livros e uma xícara. À frente de um dicionário:

“Engulo: pílula por pílula; enquanto você vai à Bahia.
(é a garganta que não está bem)
e o jazz no radinho. Não sei mesmo se
conseguirei dormir de novo como dormia na juventude.
Madrugada adentro.
No fim da vida vir parar no beco.
Aqui.
Queria fazer algo, desabafar, como chutar a boca daquele gato de novo. Saudade de virar as noites, como naquelas de seis às seis às seis.
Saudade da fábrica, do tempo em que o buraco era só latência.
Dormir na porta daquela sorveteria, não. Fez muito, muito frio.
Cafeína, calafrio. Obnubilo.
Talvez o nosso problema seja só sexual, mesmo. Aí eu vou desacreditar de muito mais coisa nesta vida, é.
Eu tomaria todo gim que já tomei, de novo; toda cachaça, de novo; todo conhaque; todo vinho, até aquela garrafa ruim lá de Ouro Preto. Eu tomaria toda cerveja que já tomei, de novo. E isto significa muito pra mim. Enfrentaria aquele cara da ambulância que não me quis deixar voltar, filho da puta... ir atrás de você no festival, não. Foi muito, muito duro. A ponto de chorar. Naquele dia trouxe para casa um dos melhores livros que já li: Distraídos Venceremos, Leminski; hoje está com a moça de quem você usou a escova de dentes e ficou grilada.
Pois é. Talvez algum dia você tenha chegado a entender, mesmo; talvez. Quem sabe?
Daqui a pouco vou tomar um banho e sair.”


É, houve alguém, mas ficou irrelevante. Agora era o beco, a aposentadoria e ainda o buraco.... o beco entre duas avenidas; já esteve entre suas duas pernas, ela que era bonita, mas até o buraco agora era outro...

...seguindo a narrativa; não usava mais nome, não precisava. Do beco ao alheio, do alheio ao beco. Sem conversa. Sempre saindo pelo corredor maior, do lado da avenida mais movimentada, quase nunca pegava o caminho da bifurcação. No ônibus a paranóia de quebrar, e a barriga com as pernas caírem para um lado e o pescoço com a cabeça e braços caírem para o outro. Na avenida brevidades com Coca para sentar lá e comer. Alheio, alheio, alheio. Na volta banana para a vitamina. O beco, o beco, o beco. E à noite na janela. Porque não deu este buraco na cabeça?!

Um sonho constante: as lagartixas pelo queixo, vindo. Duas! Uma entra e entope a narina esquerda, a outra a outra narina; e as perninhas arrastando e querendo entrar mais.

É assim a vida de uma pessoa. E vai se falar dela...

E, já que estamos no fim, mais um último dado sobre ele: passou a ter um olhar diferente para as arruelas e as porcas, principalmente às porcas. Tinha todas que via pela rua, guardava limpinhas e sequinhas. Até que achava um parafuso correspondente e passava-os para a estante da frente. Na parede um pôster dos Alpes suíços.

Uma estória.


No fim da vida ir parar no beco... que diferença do mar.

jordano

Jordano, o Lápis Vermelho.

Dani, o grande amor de Jordano.

À hora do almoço Jordano que guarda seu biscate em segredo não acredita que está vendo Dani de mãos dadas com um homem muito bonito escolhendo o que comer na praça de alimentação; mas sim, ele está vendo.

(os alto-falantes anunciam sorteios e promoções relâmpago)

Do banheiro sai o menino Fabiano e diz: mãe, mãe, mamãe, o Lápis Vermelho, acho que está chorando debruçado lá na pia.

Mamãe vem ver.

Jordano sai pela porta lateral, atravessa a BR sem saber pra onde. Crianças nos carros acenam para o lápis vermelho e um cachorro late no canteiro central.

didi mocó

Eu amei você, e amei de verdade. Mas, acabamos, vou ter que aceitar. Não dá pra dizer que terminei legal, eu me sinto mal, na sensação clichê de um nó no peito. Como o ‘eu não tenho amor, marinheiro só...’; mais exato, como representava Renato Aragão nos finais de seus filmes como Didi Mocó.

a menina de covinhas

E eu olhava, já meio tonto, toda a beleza daquele desenho, rostinho sorridente, e não conseguia que saísse da minha mente: aspas para meu pênis; aspas para meu pênis; aspas para meu pênis; aspas para meu pênis; aspas para meu pênis; aspas para meu pênis.

no abatedouro

Faz-se necessária muita força ao acertar a cabeça do boi, também é importante precisão.

E quando a besta cai de um golpe só, é como possuído pelo demônio.

Carne boa, então:

Miguel que era conhecido como Vermelho entre um golpe e outro pensava versos, Joanna os receberia àquela noite com lindinha pelúcia em churrasco surpresa de seu 23° aniversário.

O amor de Miguel a nada se comparava.

nelsinho guitarra...

- Há tanto tempo, nós aqui, tocando neste mesmo boteco, fico pensando: será mesmo que ‘o tempo não pára’?

- É...


(nelsinho guitarra e osmar dos teclados)

foi assim

Os leões desfilavam como bailarinos ao redor da casa e eu sem conseguir pensar em nada. O momento é crítico. Os urubus apareciam e a companhia telefônica: não foi possível completar a ligação. As paredes já sem espaço para a única frase: ODEIO LEÕES!

Os seus retratos sorriam nos porta-retratos por todos os lados.

o homem triste


O homem triste – 1
O homem triste que andava pela rua pisou numa casca de banana e deu um passo engraçado. Todo mundo riu.

O homem triste – 2
O homem triste quis cantar o parabéns numa festa de conhecidos, entre a sexta e a sétima palavra olhou para os lados e se recolheu.

O homem triste – 3
O homem triste foi matar uma barata, mas se arrependeu e quase chorou.

O homem triste – 4
O homem triste entrou num bar para tomar um refrigerante, acabou pedindo uma cerveja e ficou a noite inteira. De manhã sentou-se na praça.

O homem triste – 5

O homem triste uma tarde pensou na sua vida e concluiu: que abóbora.

impasse

À mesa com um cigarro no cinzeiro os dois olhavam em paralelo para direções opostas.


Daquele dia em diante tudo seria diferente, ele olhava e pensava.

A mulher traga, já não tinha o que fazer, tentaria retroceder e procurar que as coisas continuassem como sempre foram.


Só a fumaça sabia aonde ir.

angel

O grande artista acordou... manhã fria. Preparou café. O telefone toca. Tresnoitada, Pri, que tinha também o apelido de Angel, não fala coisa com coisa: sobre a relatividade consciência/inconsciente... que dependendo dela... Pri... ou cada parte de si... tomar sentido à velocidade da luz... 258000 km/s ou algo parecido... poderia amá-lo... ou não amá-lo... amá-lo pra sempre. O amaria no tempo. Ignoraria a noção de espaço. Para sempre... Para sempre... Disse também outras coisas, por outros poucos minutos, antes de desligar o telefone. O grande artista toma o café morno. Prepara copo com vodca. Põe Concertos de Brandenburgo 4, 5 e 6 no aparelho, se assenta de novo na cozinha e pensa: aquele seria o começo de um longo dia.

Pri, ignorando a noção de espaço, adormeceu como um bebê às 9 horas na casa de um seu amigo, web designer. Lá transaram, por volta de duas da tarde. Esta vida é engraçada.

I - [De quadr(i)- + -ica.]

[De quadr(i)- + -ica.]
S. f. Geom.
1. Lugar geométrico dos pontos do espaço que obedecem a uma equação do segundo grau nas três coordenadas cartesianas; conicóide.
Aurélio – Século XXI

Introdução

O homem está protegido embaixo do chapéu, e atrás das lentes amarelas tudo fica mais bonito; alegre e desinibido, tudo fica melhor. Diferente de quando usa os cabelos e as luzes naturais, ele pode ver tudo como uma cerveja veria.

Um pedaço de uma vida. A estória, e...

- Queria ser feliz igual um japonês. Queria não ficar careca igual um japonês. Queria não engordar igual um japonês. Frases que tenho depois que comecei a ver filmes de kung fu. Comecei a assistir aos filmes de kung fu por causa dele:

Vinte anos, Wagner, mameluco, filho único, segundo grau completo em escola pública, música: rock americano; feio, trabalha em uma vídeo-locadora, assuntos sem graça, mãos sempre suadas, não é tímido, tem o cabelo gorduroso e ralo, gosta de filmes de kung fu, assiste televisão até às três e acorda às onze e meia mais ou menos, pega serviço uma, tem cravos por causa do cabelo gorduroso, tem vergonha disto, a testa também é gordurosa, boca gorda, sonha comprar um carro, moreno, tatuado com uma índia de olhos verdes, fimose, paga suas despesas, bebe cerveja aos sábados à tarde, domingo joga bola, se masturba e dorme cedo.

São as melhores informações que já consegui.

É Wagner, meu vizinho do lado, uma pessoa que me parece feliz. Mora com a janela meio de viés com a minha. Moro faz quatro meses aqui, há três o acompanho... Nossos horários são mais ou menos os mesmos, bebo e fumo enquanto o observo vendo todos os filmes de kung fu que traz pra casa. Em outros termos, Wagner é um paralelo para minha vida nos últimos tempos, uma historia que vem progredindo e que espero enquanto passa. Um exemplo: quando venho com alguém para casa, geralmente Joanna, me mantenho acordado até depois e vou ver Wagner deitado no travesseiro do chão, e o pôster do Bruce Lee na sua parede. Quando viajo e volto, vejo Wagner e continua a mesma coisa. No café após o almoço penso em como seria se eu fosse Wagner.

Joanna:

Joanna é a menina que tem vindo com mais freqüência em minha casa, nova, novinha, 19 anos, a gente sempre vem pra casa bêbados e ela não chega a perceber meu desconforto em relação à outra vida que não tenho, a vida que Wagner tem... melhor não dizer, sei que é difícil entender destas coisas, principalmente quando se tem 19 anos. Acontece de ela fingir enquanto escuta Piazzolla que gosta também, eu tenho certeza que finge, esta certeza chegou quando me mudei para cá e virei vizinho dele, no fundo sei que ela queria é estar ouvindo Oasis com ele, na minha profissão deveria reconhecer isto como paranóia, mas, puta que o pariu. Gosto de Piazzolla e tenho os discos, tenho medo de querer começar outra vez uma nova coleção, ando ultimamente com pouco dinheiro, meu aparelho de CD’s quebrou e complica achar Oasis[1] em long play, droga de vida... Joanna tem os seios (detesta a palavra seios, segundo ela é antigo, e a partir daí ‘seios’ para mim é como Piazzolla) miúdos e muito bonitinhos, bonitinhos que só eles. Tem pernas de tenista e um interfemínio que é uma beleza, lindo, e é o que há de mais lindo em uma mulher. Gosto muito de Joanna, e melhor não sei dizer.

Wagner.

Conheço Wagner da vídeo-locadora Happy Vídeo, tenho ido lá constantemente e gasto tempo, mais que necessário sempre, para escolher um filme. Sempre está na tevê um vídeo de kun fu ou caratê... porque será que Wagner não faz, então, academia; que coisa enervante.

Uma impressão que tenho é que Wagner nunca leu um só livro na vida, talvez O Pensamento Vivo de Bruce Lee, não sei. E eu que já li tantos, pra quê? para quê... para agora observar Wagner e ter inveja do sossego, do sossego, que eu sei! que ele sente! Wagner é realmente enervante.

Dizendo agora de mim, consegui odiar Monteiro Lobato.

Tenho licença para meu doutorado, minha tese se baseia nele, Monteiro Lobato. A academia tem admirado meu trabalho até demais – enquanto admiro Wagner. Bosta. Já penso, depois do fato, no meu ridículo, consegui chegar ao cerne: foi Monteiro Lobato só por ser bacaninha, coisa de infância misturada com idéias grandes, e sei que é este ‘alternativo’ que a academia congratula comigo, e que isso para Wagner não tem o menor valor, nem deve saber que existem teses. Meus problemas têm sido sérios e muitas outras questões apareceram, muitas questões. Wagner apareceu em minha vida e tenho desbaratinado, estou todo sem saber sobre as coisas a partir de então. Tenho deixado de ler o necessário para assistir Bruce Lee. Rá, rá.

Então.

Nasci, cresci num bairro pobre tendo contato na rua com a gente deste bairro, mas meus pais sempre se esforçaram para me dar ensino nas escolas mais para ricos e assim por diante nunca precisei trabalhar, o caminho foi estudar e levar a vida, conseqüentemente com pessoas ricas, à maneira delas, cheguei à vida acadêmica... Quando saí da rua começou meu marasmo. Meu pai não tinha um caminhão para me deixar, como meu vizinho; tinha os estudos, estudei. O raciocínio normal é que estas pessoas com quem tive contato na rua trabalham pra gente estudar; eu, com o passar do tempo, já penso diferente: a gente estuda para eles viverem. Na nossa vida a alegria é muito esquisita, é tão difícil e tão dura, sustenta tão pouco: “bom mesmo é ter um caminhão”. Joanna gosta de ouvir Chico comigo também, penso em comprar Red Hot Chilli Peppers, que eu sei que encontro em LP, para ela ouvir.

‘Meu grande erro foi nunca ter dito a Joanna que a amo, os anos foram passando e eu perdi a oportunidade. Cabeça fraca, muitas noites inteiras a muito álcool, os dias passaram. Eles passam e vão levando muita coisa junto com eles.’


Quinze para as quatro da tarde eu levantei, Joanna já estava na sala ouvindo os discos que ela diz que gosta. Ontem Joanna depois de bêbada me propôs sair pra dançar, e ela sabe que eu não sei dançar, ela sabe que eu só sei fazer coisas que não precisam de muito movimento... Tenho que dar mais atenção a Joanna.

- Joanna, que tal sairmos para um sorvete?

- Não, querido, acho que já vou.

Capítulo 1
E o cara vai ao supermercado comprar seu uísque, a marca que ele compra é média e o caixa até lambe os lábios quando abre a prateleira dos uísques, passa pela cabeça sua futura noite de sexta, queria muito uma garrafa daquelas, resolveu pegar uma escondido no final do expediente. As pessoas na fila têm que esperar com paciência, mas uma senhora que comprava aipo perde a calma e muda de fila. Um carro esbarra no dele no estacionamento, não chega a estragar, ele não vai ficar sabendo. As Reinações de Narizinho empoeirado permanecem ao lado do computador. Joanna em casa olha pro teto deitada na cama. Ele caminha de volta pra casa e o sol bate ainda para cortar os prédios ao meio, ele se lembra que veio de carro e volta para buscar. Encontra com um amigo de faculdade e a filha, tem nojo do rosto da menina sujo de Danoninho ressecado: pensa em Joanna. Liga para Joanna que diz que está muito cansada e prefere ficar esta noite em casa.

O cara abre o uísque e joga a tampa fora, a tampa vira um brinquedo pro gato de Joanna, ele vai beber no alpendre, do lado contrário a janela de Wagner. Pensa na vida e conclui: que abóbora; gosta da comparação. Pensa em Ângela e sente saudade, tinha vinte e nove anos, agora 32.

‘Minha terceira personagem para o quadro final de uma estória não muito longa, a quarta comigo, sobre ela pouco tenho a dizer a não ser do seu cachecol, combinávamos na bebida e no pó... saudade, tenho pouca, ela jamais me amaria nesta condição...’

O dia escurece, a noite cai. Parece uma música do Tom, mas ele põe na vitrola as músicas do Chaplin... Chaplin, Chaplin, Chapolin, Chaves, Chopin, Chapolin, Rasputim. Ele pensa que tudo é muito engraçado. Ele pensa que tudo é azul. Chaplin, Chapolin, Chaplin, Chapolin, Reinações de Narizin. Daniel Azulay. Barbapapa azul. Pega o telefone e ainda lembra o número de Ângela de cor. Joanna resolve falar com ele e acha o telefone ocupado – as coisas continuam engraçadas. Ângela atende ao telefone olhando para a televisão.

Capítulo 2
As coisas vão ficando bestas, aí vêm os vícios ou as religiões... ou então as pessoas decidem ir ficando bestas junto com as coisas. As que pensam um pouquinho para além não agüentam e tentam fuga, neste caso não tem isto que dizem: suportar. E vícios são importantes, até os que têm as religiões os têm, é o lado que automatiza a vida. Joanna ainda não passou por este segundo Édipo para sair por aí sabendo que é cega nas coisas, ela ainda acha que enxerga e que vai ter um grande amor possível, isto me dá aflição em Joanna... ela pensa que vai vencer batalhas. Ao contrário de Ângela; tem sua novela e cheira muito nos finais de semana, é muito ansiosa durante a semana, ela precisa cheirar e isso é importante – amei Ângela. Joanna quando bebe não sabe o que está fazendo, ela não sabe que beber é coisa séria.[2]

‘Todo grande Homem ou foi religioso ou viciado; ou não perceberam que ele não passava de uma besta.’


Eu tenho problema com bebidas e com os gatos, voltando a falar de mim; tenho compulsão por enfiar um naqueles buracos redondos em que se joga vidro para reciclar, nunca fiz. Quando era pequeno dei um chute na boca de um que voou uns oito metros e caiu abobado. O moço que passava me deu um tapa na orelha que doeu uma semana, não tive coragem de contar para minha mãe. Ela também não gosta de gatos, acho que é por causa disto que também não gosto; mas quem tem vontade de judiar sou eu. Não faço mais... “dorme, dorme minha culpa”. Colocar as culpas para adormecer, os pecados, tudo aquilo... (lembra-se de quando xingou todos seus amiguinhos de pobres e sujos quando um deles, lembra-se que este tinha paralisia infantil no braço direito, mijou nas suas costas quando estava sentado num barranquinho, lembra-se de quando fazia orações para poder se masturbar, lembra-se de quando mentia para seus pais que já morreram, lembra-se de quando não gostou de um presente de natal e chorou a manhã do 25 toda, lembra-se do aborto, e as coisas não estão mais engraçadas como no capítulo anterior, vão ficando bonitas e doces e ele se lembra do rosto de Joanna que faz quarenta minutos saiu com umas amigas para noite). Como vão as coisas Charles, oba, oba, oba Charles.


Capítulo 3
Tenho apenas nove laudas - puta que pariu, nove laudas! - da minha tese e venho recebendo para isso, vai grande parte em bebida, com Joanna ou só. E Wagner deu para desenhar a lápis HB os Dragon Balls. Lápis HB mordido. Meu laptop. Chego na locadora a tarde e ele está desenhando. Porque que eu ouço Miles se existe Lulu Santos?... Tenho acordado diariamente com ‘puta que pariu’ na cabeça, é a primeira frase que me vem quando acordo, diariamente. Antigamente punha Vivaldi e olhava o dia uns três minutos pela janela, tomava café, lia os jornais, estudava e escrevia por longas horas – só meus alunos até hoje leram o que escrevi nesta época, tiveram as provas, alguns professores disseram que leram e ‘gostaram muito’; acreditei, mas de três meses pra cá, duvido... Hoje em dia é isso, e só dá pra levantar depois de muito tempo olhando pro teto, aí vou pra janela contrária ao dia antes dele sair para trabalhar. Ainda é bom quando Joanna está em casa, ela acorda e vai ouvir música, fico intimidado a achar que eu estou no caminho certo... sinto saudade de antes, da quarta-série, das pipocas de arroz e de falar keds, e de jogar os keds velhos em fio de luz. Regressões, regressões... talvez tenha sido Narizinho... eu não era assim. Reinações de Narizinho... Narizinho, vou jogar keds no fio de luz.

Capítulo 4
Wagner, um ano mais velho que Joanna, meu mundo fechado em dois adolescentes, a total ocupação para meu dia. Meu mundo cercado entre duas pessoas - cada uma e eu um, metades da minha idade, as duas meu tempo de vida, metade-metade-metade-metade, o mesmo em mim. Joanna quer seguir a carreira acadêmica, como eu aos 18 anos, e Wagner. Metade, metade, metade, metade. Joanna folheando meus livros de calcinha e camisetinha de short doll, os pais dela nunca deram muita atenção para o pequeno tesouro que têm. Os pais de Wagner basicamente só assistem tevê, a mãe cozinha e o carro arriou na garagem, a treliça da cozinha fechou com gordura. Joanna cresceu no playground, o porteiro a sentava no colo. Creio que ninguém nunca beijou aquela boca gorda esbranquiçada de Wagner. Joanna de cabelos molhados e bunda de fora. Joanna com hálito de vodka. Joanna deitada por cima de mim é a melhor hora do meu dia. VHS’s na locadora, cheiro de pipoca de microondas. Wagner querendo ser Bruce Lee, ela Lacan... aquelas discussões de criança – e se puser os dois pra brigar!? ...acho que vira eu. Oba, oba, oba, Charles...

Capítulo 5
Sem mais... quero dizer... quase toda estória é uma história de amor.

Considerações finais
...quase toda estória é uma história de amor.

Anos se passaram e a aposentadoria chegou por invalidez junto com a compra de um apartamento no centro da cidade, no quarto andar. Não tem saído muito fora a não ser para ir ao supermercado, quando sai é de chapéu e lentes amarelas. Tem tomado Velho Barreiro e o passatempo predileto tem sido cuspir na cabeça das pessoas que passam, quase nunca acerta, mas se diverte muito com isso. Volta, pula na cama e ri bastante. Sobre Joanna, Wagner e Ângela não soube mais, mas antes disso enquadrou foto dos três juntos em uma festa que deu no seu antepenúltimo apartamento quando ainda era vizinho de Wagner. Chegou a ser grande amigo e confidente de Wagner, foi quando Joanna o deixou.

‘Meu grande erro foi ter dito a Joanna que a amo, os anos foram parando e eu perdi a oportunidade. Corpo fraco, muitas noites inteiras a muito álcool, os dias pararam. Eles param e vão deixando muita coisa junto com eles. ’
Beijos...








[1] Aos 53 completei toda a coleção, foi quando atirei Piazzolla pela janela
[2] Com este recorte já podemos caminhar para um fim, se sabe pouco mesmo sobre a vida das pessoas e o excesso pouco acrescenta

INFANTIL



João Bobão andava meio sem cão. Foi à pet shop e comprou logo três de uma vez.

Um morreu por falta d’água, outro fugiu, o terceiro mordeu tanto João Bobão que ele precisou devolver... Êta João Bobão!

família feliz

Aquela, sim, era uma família feliz. E quando digo feliz não quero dizer um feliz qualquer, quando digo feliz, é algo realmente de fazer inveja. Feliz de acordarem cantando hinos e recitando poemas em louvor a tanta felicidade. Feliz de sentarem-se à noite ao redor de uma fogueira em seu quintal para assar batatas e fazer queijo quente. Era uma família tão feliz que esperavam sempre todos estarem juntos para levar o cãozinho para o banho. Marina, a empregada da casa, enquanto servia os pratos para o jantar; de mãos dadas toda aquela família fazia uma mesma oração, em que basicamente agradeciam por aquele momento de estarem juntos mais do que pela comida; quase sempre acabavam chorando e com seus corações acelerados. Numa última reforma da casa mandaram abrir paredes entre o quartos, porque aquela era uma família feliz. Bebedouros para pássaros nas janelas, samambaias e cinco cadeiras de balanço no alpendre para os fins de tarde. Que família feliz. Aquela sim. De tão, tão feliz, fico dando voltas sem saber como explicar. Era uma família tão feliz que... poxa vida...

fantoche donald

Quando era criança eu tinha um fantoche com cabeça de borracha que conversava muito comigo.
Donald o fantoche me falou sobre coisas incríveis.
Na mudança de caminhão aberto que fizemos em 1987 perdi o fantoche Donald.
Desde então não acredito em nada e me entreguei à bebida.
Barbie que cuide de mim.

hoje estou a mil

Hoje estou a mil. A melhor roupitcha e barba feita; roupitcha..., ah, eu sou engraçado! Dançar na cama enquanto seco os pés daquela beleza de banho. Ai, ai, ai; hoje é hoje. Perfume, perfuminho e aquela calça cotelê. Um trago, um tapa, hoje estou demais. Vontade de uivar na janela... vontade de saber dar uma estrela ou plantar bananeira como não consigo mais. Ui, ui, ui. O tempo passa e eu nem sei, gasolina no carro e dinheiro na carteira. Hum!!! Meu blusão vermelho, porra! Aquele broche que não uso faz anos. Hoje alguém que me segure, vou que vou tinindo, tudo indica que estou prestes a fazer alguma grande besteira.

emerson

No final da noite, e sem ter conseguido nada, foi o carteiro Emerson comer um dos últimos travestis que se prostituía na Santos Dumont. Não é que deu o azar de cair justo nas mãos de um daqueles filhos da puta que de sacanagem e sem vergonhice põem com fita aderente meia gilete preso entre as nádegas...

Eta Emerson...

gosto muito de minha tv

Gosto muito da minha tevê, que sempre sabe do que estou precisando, nas horas certas, uma pena que não me lamba, ou me chupe, me sente as unhas ou estale e fique vermelha com meus cinco dedos por todos os lados sempre quando eu queira. Gosto pra caralho de minhas garrafas de uísque, da cachaça, essas ainda conversam comigo pela madrugada, uma madrugada ou outra, muitas delas, mas não me lambem, elas não me lambem. Ou se minhas músicas, também, me lambessem, meu PC criasse língua, aquela peça de picanha na geladeira dissesse ‘vem!’, se você aparecesse por debaixo da mesa...

ele vinha gordinho

a bunda de maria alice

Maria Alice acorda e vai à cozinha. Hoje é sábado. Para um clichê, Maria Alice meu anjo azul.

Maria Alice volta. Abre a cortina e as folhas da janela. A bunda de calcinha, três anos de vida a dois.

- Maria Alice... me traz o café? Alice sabe que sem açúcar.

Traz o café e volta pra janela, olha do sétimo andar a avenida. A bunda de Maria Alice, tantas histórias de nós dois esconde. Mesmo que só eu as tenha, que sejam as histórias de uma visão unilateral, em minha mente, mesmo que nunca as exponha, uma construção, somente para mim. Contemplo. Penso. Trago o cigarro que neste ínterim acendi. A bunda de Maria Alice. Penso. Bunda que estará ali, sempre em minha mente, não como forma imperfeita neste mundo de aparências. Estará, sim, suspensa no ar! sempre! como no Beco para Manuel Bandeira.

II - Que legal! Daniel se encontrou!

E a vida é assim mesmo, mas felizmente Daniel se encontrou. Nas idas e vindas com o cansaço...
Desenhou ele próprio indo à estação de trem, gostou muito da idéia, imaginou ao fundo Oswaldo Montenegro, bem de leve. Era a vida que queria. Entrou às duas no elevador com cartolina e hidrocor. Ninguém entrou durante duas horas e ele pra cima e para baixo. Era quase todo final de história... despedido. A vida em círculos... desenhando várias paradas e estações, em volta de um mundo, em círculo, em círculo. Encontrava ursinhos peludos e topogãs de girafas. Viajava sempre, sempre.


Boa noite Churruminos, bom dia Sr. Rei da Vila.

E em cada estação era ela que o recebia com flores e um shortinho de algodão. Em cada poste pela janela uma nova garrafa à mesa. Cortesias do rei da vila... rá rá rá rá. A vida vai adiante se no trem é lugar para se ser feliz. Rá rá rá.

E sábado eu vou, eu vou...

PRIMEIRA PARTE
Sentado no quarto numa tarde de sábado enquanto seus amigos foram a uma festa num lugar em que não freqüenta. O dia vai escurecendo, a idéia clareia e vem:

Antes que a loja feche buscar aquele disco para passar a noite.

Depois de uma hora e meia senta num bar com a compra, o último do Oswaldo Montenegro.

Uma cerveja...

Seis cervejas depois, uma e meia da manhã. Telefona para ela.

Onde está você?

Ele sabia que ainda estava na festa.

É muito difícil dizer, mas de uns anos pra cá sei que só funciono quando bebo; sem beber é melhor ficar sozinho. Só bêbado consigo dizer a quem amo que amo, e sei que amo mais mesmo depois de beber; não que não ame antes, mas estrago tudo sóbrio... À tarde ela me ligou e insistiu, eu não quis, e não queria mesmo, era muito esforço.

A verdade é que ele ama tanto que não dá conta; bêbado dá e diz, e faz.

Bêbado abro os braços e digo que amo; na maioria das vezes nem sabem que estou bêbado e as coisas funcionam, a vantagem, poucas pessoas sabem quando já bebi. Noutro dia estava com ela tomando meio copo, daqueles de requeijão, pinga branca e Joanna pensou que era água, andava tudo certo. Sei que pensou que era água porque senão teria me xingado bem antes de sentir o meu hálito quando foi me dar um beijo. Tinha ido à adega dela sem ela ver.

A idéia de comprar Oswaldo Montenegro já vinha havia muito tempo, foi uma tentativa de voltar a ser feliz e amável antes de beber, propositadamente. Comprou Oswaldo Montenegro para tentar ser feliz. Já tinha tentado outras coisas; a terapia do riso por exemplo, consiste em: acordar e conseguir não abrir os olhos; obtido sucesso começa-se a rir o máximo que puder até se sentir bem, não parar enquanto não se sentir bem, diariamente. Tentou fazer ginástica também, tentou outros vícios, tentou cuidar de plantas, colecionar.

Até hoje a bebida só me trouxe coisas boas, antes de beber era difícil. Fico pensando nos momentos bons que ela já me trouxe e que eu já perdi sem ela, não foram poucos.

Em seu trabalho de ascensorista é tudo bem mais fácil.

Décimo primeiro, décimo segundo... aqui é meu castelo, daqui eu controlo vários metros, de alto a baixo, de baixo ao alto. Ai se a vida pudesse ser sempre esta vida em vertical. Odeio as oito da noite quando tenho que voltar pra minha vida horizontal; e enquanto eu subo e desço em qual abscissa você anda?!

Tem aftas quase constantemente em sua boca, perdeu grandes paixões pela falta de memória que irritava. Perdeu o amor que deixou o seguinte bilhete: Eu te amo, mas mudou, não me procure mais... Em outras palavras: como vai a cor do seu cocô, rapaz? Você emagreceu bem; queria que fosse tão bonito quanto antes quando ficava nu. Como vão seus intestinos? Como vai o tônus muscular? Cuidado, você já está quase sem amigos, você está cada dia pior, as costas entortando; poucas pessoas ainda têm paciência de tentar entender você. Eu amo, amo você e quero que esteja bem nos próximos 20 anos pelo menos; mas não vamos nos ver mais......Cuidado com os comprimidos...
Sabe todos os que são para fazer sair do ar e dormir; contra alergia, febre, enjôo...; infantil, adulto, ervas... mas em ervas não confia muito pois parte do principio que remédios que não têm contra-indicações não fazem efeito. Quem inventa um para alegria? rá rá rá.

Ninguém sabe das noites que eu passo...

Bebe.

...

A vida já foi fácil?

...

Hoje você vai a uma festa! Que bom rapaz.
Convidaram para uma festa, insistiu em não ir, mas foi a um magazine, comprou uma roupa, um sapato e foi. Ficou até as sete e quarenta da manhã, entrou no elevador cinco para as duas sendo o seu horário duas. O elevador foi um útero neste dia. Só ouvia números e boa tarde; não sabia o que dava mais alegria, os números ou os boa tardes.


Oito horas e, puta que pariu...

Noutra vez para fugir da sua cabeça, com ela no carro estacionado, um dia de muita chuva; apagou o cigarro no braço esquerdo na parte de baixo do bíceps, fez uns pontos, quando olha a cicatriz pensa ter feito o desenho dela.

A vida é doce e as pessoas precisam saber disso.
A vida é doce e as pessoas precisam saber disso.

...

Queria saber como as pessoas conseguem ficar amigas dos garçons, gente que freqüenta aqui há tanto tempo menos que eu chegam e já estão em casa, o garçom é amigo e eles brincam. Eu chego e o garçom me serve. Podia o garçom me amar tanto quanto ama esses caras.

Fez uma brincadeira na próxima cerveja, o garçom não entendeu deixou a cerveja e voltou.

Nos motéis do centro da cidade uísque é barato, quando batia o sino e eu rodava o balcão giratório, ele era para mim um altar. Impossível explicar a sensação. Impossível esquecer dela sempre quando passo nas portas, vários. Conhecemos tantos que uma vez tive idéia de escrever um GUIA DOS MOTÉIS DO CENTRO DA CIDADE... ela brigou com a minha idéia... Os alpendres pequenos, uns quartos sem janela, o chão queimado de guimbas, os chinelos 41/42 gastos no pé das camas com colchões revestidos em courino, a suadeira, o banho. O sabonetezinho que eu sempre levava para casa, que gostoso! entregar a chave pela grade, descer a escada íngreme e sair. No pior deles um senhor de jeans e chinelo de borracha era quem cuidava, chegamos com ele lendo uma Bíblia Sagrada, continuava lendo duas horas depois... mesmo com aquela gritaria? Lembro de um sorriso delicado na sua cara. Era lindo. Era aquilo.

...sempre achou horrorosas pessoas quase sem queixo.

Outro dia vi um homem sem queixo; comentei num recado no celular. Ela respondeu.

Ironicamente; fez questão de dizer que estava acordando e na casa de um amigo. Rá rá. Sofreu pra burro às 10 da manhã. Bebeu pra burro 10 e 15; chorou pra burro 11. Recuperou? Sei que ele queria que ela soubesse que ainda a ama de verdade, que ele soubesse que a ama de verdade e que todo mundo soubesse; tudo, tudo fosse diferente. É difícil tomar tanto gim.

Sei que agora, a qualquer momento ela pode estar na esquina, no centro, no bar, no Rio, na roça, na China... queria muito ver você de novo. Deve estar querendo ver outro.

Mulher.

...

Entra na mercearia, vê o picolé!

Puta merda! Anos não vejo um picolé! Que legal! Um picolé! Que bom! Será que tem palito sorteado!
- Um Chicabom de chocolate!
Cabeção! Cabeção!

Lembrou do apelido de infância...!

PARTE 2

Contrito?
Está chovendo, molha as plantas e elas ficam felizes. Ele sente neste dia falta dela no corpo.
Além disso as costas cobram o movimento do quadril entre suas coxas.
Tadoma por outras vias...
Bar, que diferença do mar, não dariam certo em grau. Numero e gênero é que foi o ideal. A tentativa de fazer um poema onde ela após ler voltaria ao lar, rá rá rá... Ele está sentado num parque de diversão, aliás, eu estou sentado num parque de diversão, se parque de diversão é um lugar para ficar feliz.
Chorumela...
Na área de serviço tanta garrafa vazia. Ele vai ao samba se o samba é lugar para ser feliz. Olho pra lua e canto. Gim é um gênio. Ele levanta da cadeira e eu sambo, e eu sambo mesmo, se sambar é coisa para ser feliz. Sambo muito, sambo o máximo e sambo e canto olhando pra lua. Tenho os intestinos soltos.
Cabotino.
Volto pra casa e durmo às 9, se inteligente é quem vai pra cama mais cedo, sonho com os anjos...

PARTE 3
E a vida continua, algum tempo. E o apelido de infância...

Prevendo que o pior acontecesse, resolveu não mais continuar. A vida em L? A vida em círculos! E tentamos muito que ele voltasse, a mesma resposta: sábado... era assim. Nas entrelinhas da história não se sabe o que se passou, não se sabe o que ninguém passou, e há cabeças e cabeções; quando perguntávamos se estava bem: cabeção, cabeção... respostas para ele mesmo. E o apelido de infância. Vai se tentar falar da vida de uma pessoa... Se é assim que tem que ser.

ÚLTIMA PARTE – OU DANIEL SE ENCONTROU, QUE LEGAL!
E ele sabe que a vida continua. Cartolina e hidrocor. E os ursinhos eram mesmo uma gracinha... Caso você queira saber mais sobre ele.

sábado eu vou, eu vou...